Após estupro, uma menina de 11 anos foi impedida de interromper a gravidez por decisão da juíza Joana Ribeiro Zimmer, em Santa Catarina. O caso da semana passada se une ao de milhares de vítimas em todo o Brasil – segundo a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, em 2021, 18,6 mil das denúncias de violência sexual tinham o público infantojuvenil como vítimas. Casos tomando os noticiários preocupam pais e cuidadores, e a psicóloga Karen Stefanny Ramos, também professora do curso de Psicologia do Centro Universitário Fametro (Unifametro), atenta possíveis comportamentos que auxiliam a identificar se crianças e adolescentes estão sofrendo abuso.
Karen explica a irritabilidade extrema e isolamento como nunca antes visto como algumas das condutas mais evidentes. “A criança tende a prolongar o sofrimento, manifestando expressões de ansiedade na medida em que tenta comunicar a dor emocional. Também pode ser observado o surgimento de medos que não existiam mais naquele período de vida, de modo que a criança se sente desprotegida, mas não consegue verbalizar de maneira clara”, detalha.
As reações comportamentais se dão, segundo a profissional, pela falta de recursos emocionais suficientes para lidar com os traumas causados pelo abuso sexual. “Com o corpo ainda em processo de formação e cérebro não maturado, crianças e adolescentes estão em posição de vulnerabilidade, demandando assim dos adultos cuidados constantes. Por isso, em situações de violência, os adultos precisam estar ainda mais atentos aos sinais comportamentais dos filhos.”
Mais importante que remediar, é prevenir – a prevenção de casos de abuso sexual na infância e na adolescência passa, sobretudo, pelo diálogo de pais com filhos sobre assuntos considerados tabus, como sexo e cuidados com o corpo. Karen defende que “quando falamos sobre isso com eles, se desenvolve um conhecimento sobre si que ajuda a reconhecer situações em que o corpo for desrespeitado e, assim, eles podem identificar que precisam buscar ajuda”.
Gravidez após abuso sexual
Para Karen, dentre os diversos impactos da violência sofrida por uma criança que vivencia uma gravidez precoce, estão os impactos emocionais, que interferem no desenvolvimento psíquico. “Para além das mudanças hormonais e físicas, uma gestação demanda mudanças na imagem que a mulher precisa passar a ter. É importante que fique claro que uma criança não é capaz de ser mãe porque não tem nem recursos cognitivos ou emocionais para construir a ideia de cuidado que, na verdade, ainda precisa para si mesma”, enfatiza a especialista.
Carlos Teixeira Teófilo, especialista em Direito Penal e professor da Unifametro, explica que, casos envolvendo menores de idade, como o de Santa Catarina, a legislação penal brasileira, por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), busca sempre garantir o julgamento favorável do Poder Judiciário ao menor. “Além de todo o trauma sofrido pela criança por conta do estupro e da gravidez, ter um filho nessa situação seria emocionalmente terrível não só para a mãe, mas para o próprio bebê”, defende.
A juíza do caso recorreu a estudos médicos que dizem que o aborto só deve ocorrer até a vigésima semana de gestação, enquanto a menina já estava na vigésima segunda semana. Para Carlos, a jurista teria de seguir a lei penal, que não estabelece o tempo de gravidez para a interrupção gestacional.
“A juíza do caso quis levar em consideração estudos sobre o tempo ideal de gestação para a realização do aborto, mas esqueceu sobre os estudos relativos a riscos de uma criança dar à luz a um filho. Em casos de risco de vida da gestante, bem como quando a gravidez é resultante de estupro, o Código Penal Brasileiro, em seu artigo 128, diz que não haverá nenhum tipo de punibilidade, desde que praticado por um médico”, esclarece.